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STF e Retrocesso: Execução da Pena Imposta em Condenação Oriunda do Tribunal do Júri Pode Ser Imediata
Regiane da Silva Cardoso
15 de set. de 2024
No último dia 12 de setembro de 2024, durante o julgamento do Recurso Extraordinário nº 1.235.340, o Supremo Tribunal Federal, em maioria composta pelos Ministros Roberto Barroso (Presidente do STF e relator), André Mendonça, Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Dias Toffoli, decidiram que a soberania dos veredictos do Tribunal do Júri autoriza a imediata execução da condenação imposta pelo corpo de jurados, independentemente do total da pena aplicada
Esse entendimento é ainda mais gravoso do que a alteração trazida pelo pacote anticrime (Lei. 13.964/19), que inseriu no Código de Processo Penal o artigo 492, inciso I, alínea “e” que autoriza a execução provisória de pena igual ou superior a 15 anos, em decisões oriundas do Tribunal do Júri, independentemente da presença de requisitos autorizadores da prisão preventiva.
Tal entendimento representa evidente retrocesso interpretativo, e ainda legitima a inconstitucionalidade de decisões judiciais nesse sentido, oriunda de uma Corte Suprema cujo papel fundamental é justamente proteger a Constituição.
Convém relembrar que o artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal dispõe que: ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Não está escrito na carta magna que há exceções quando se tratar de decisões provenientes do Tribunal do Júri.
Quanto à previsão do artigo 5º, inciso XXXVIII, alínea “c” que garante a soberania dos veredictos, é mister explicitar que não há hierarquia entre normas constitucionais e muito menos contradição entre elas. Segundo constitucionalistas, o princípio da unidade da Constituição garante que a Constituição seja interpretada como um todo, garantindo harmonização de tensões entre normas.
Com a interpretação adotada pelos ilustres ministros, foi mitigada a presunção de inocência, a plenitude de defesa, entre outras garantias fundamentais, igualmente previstas na Constituição e de mesmo peso normativo.
Além disso, ressalta-se a falta de consideração de situações práticas de quem vive o plenário no dia a dia profissional. Segundo a controvérsia levantada por Evinis Talon, em uma situação em que o plenário é evidentemente nulo, por desrespeito aos procedimentos previstos no Código de Processo Penal como menção pelo Promotor de Justiça ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento, nos casos em que o juiz faz vista grossa, se o acusado for condenado após responder ao processo todo em liberdade, terá de esperar a apelação preso, em razão de uma decisão condenatória do plenário, realizado fora dos moldes legais. E quem ousa dizer que isso não acontece na prática, evidentemente não frequentou muitos plenários do Júri.
Outra situação exposta pelo advogado criminalista João Neto, é o grave cerceamento de autodefesa que ocorrerá a partir de agora. O direito de autodefesa é um direito fundamental do sistema jurídico que garante ao réu a oportunidade de se defender em um processo legal. É uma garantia que se concretiza na oportunidade de o réu expressar sua versão dos fatos, responder às acusações e esclarecer sua posição.
Com a possibilidade de execução imediata da pena após condenação pelo Tribunal do Júri, o acusado que respondeu o processo todo em liberdade poderá sair preso ao ingressar em plenário, afinal o resultado do Tribunal da democracia é imprevisível. Com isso, muitos deixarão de comparecer pessoalmente e prestar suas declarações sobre o fato, justamente para não correr o risco de sair preso, o que evidentemente causará prejuízos à defesa.
Por fim, cumpre relembrar que essa decisão demonstra evidente contradição na jurisprudência da própria Corte Suprema, que no julgamento do RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS 107.261, decidiu que: não viola o princípio constitucional da soberania dos veredictos, o comando de realização de novo julgamento pelo Tribunal do Júri, no caso de decisão (absolutória) manifestamente contrária à prova dos autos. A soberania dos veredictos não é um princípio intangível que não admita relativização. A decisão do Conselho de Sentença quando manifestamente divorciada do contexto probatório dos autos resulta em arbitrariedade que deve ser sanada pelo juízo recursal, nos termos do art. 593, inciso III, alínea d, do Código de Processo Penal.
Assim, pode-se concluir que quando a decisão dos jurados é absolutória, não há intangibilidade da soberania dos veredictos, podendo-se anular o plenário e determinar a realização de um novo. No entanto, quando a decisão é condenatória, a soberania dos veredictos deve ser respeitada promovendo-se a imediata execução da pena imposta, independentemente do quantum de pena imposta e dos requisitos da prisão preventiva.
Esse entendimento, com a máxima vênia, não se coaduna com um Estado Democrático e Constitucional de Direito.
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